terça-feira, 24 de maio de 2011

Requisito da Definitividade Vertical do Acto Administrativo Impugnável
Anteriormente à reforma do Processo Administrativo, a impugnabilidade contenciosa do acto administrativo, dependia da necessidade de prévio recurso hierárquico, nos termos dos art. 25º e 34º LPTA. Uma parte da doutrina sempre defendeu a inconstitucionalidade dessas normas, por entender que violava os princípios constitucionais da plenitude da tutela dos direitos dos particulares (art. 268º/4 CRP), da separação entre a Administração e a Justiça (art. 114º, 205º e ss., 266º e ss. CRP), da desconcentração administrativa (art. 267º/2 CRP). Com a reforma, a exigência de prévio recurso hierárquico foi eliminada, sendo que o actual art. 51º/1 CPTA consagra a impugnabilidade contenciosa de qualquer acto administrativo que seja susceptível de lesar direitos ou interesses legalmente protegidos dos particulares, ou que seja dotado de eficácia externa, que é reforçado pelos art. 59º/4/5 CPTA.
A doutrina maioritária reconhece a revogação desse requisito, no entanto, passou a ser objecto de discórdia a “extensão” dessa revogação. De acordo com uma interpretação mais restritiva, Mário Aroso de Almeida, considera que o CPTA não tem o alcance de revogar as múltiplas determinações legais, que instituem impugnações administrativas necessárias (exemplo art.167º CPA), que só seriam revogadas mediante disposição expressa, ou seja, as decisões administrativas continuam a estar sujeitas a impugnação administrativa necessária, nos casos em que isso esteja expressamente previsto na lei. Para além disso, rejeita a posição que defende a inconstitucionalidade da manutenção dessas normas, pois considera que não cabe à Constituição estabelecer os pressupostos de que possa depender a impugnação dos actos administrativos, em termos de se poder afirmar que eles só são legítimos se forem objecto de expressa previsão constitucional (parece igualmente ser a posição defendida pelo Tribunal Constitucional e pelo Supremo Tribunal Administrativo). Quanto à posição contrária, esta é defendida pelo Professor Vasco Pereira da Silva, que faz uma interpretação bastante mais alargada, tendo em conta que, considera a revogação da “regra geral” como uma revogação implícita de todas as normas que se limitavam a reiterar o mesmo regime jurídico, também não considera possível a compatibilização do princípio geral de acesso à justiça, independentemente de recurso hierárquico necessário, com as “regras especiais” que supostamente manteriam tal exigência, não faz sentido continuar a ser exigido, na medida em que já foi considerado desnecessário. Observa igualmente, que não seria necessário uma revogação expressa dessas disposições especiais, aplicando antes o regime da caducidade por falta de objecto. Utiliza também um argumento de ordem sistemático e constitucional, relacionado com o direito fundamental de acesso ao contencioso administrativo (art.268º/4 CRP), que estabelece um princípio de “promoção do acesso à justiça (art.7º CPTA), segundo o qual o “mérito” deve prevalecer sobre as “formalidades”, o que implica” entre outros corolários, a regra segundo a qual devem ser evitadas “diligências inúteis” (art.8º/2 CPTA), considera que é bastante inútil a continuação da exigência de uma garantia administrativa prévia, quando tal exigência deixou de ser um pressuposto processual de impugnação dos actos administrativos. Do ponto de vista constitucional, não seria admissível a existência de excepções ao direito fundamental de acesso à justiça administrativa. Em conclusão, o Professor Vasco Pereira da Silva apresenta uma solução para compatibilizar os regimes jurídicos do procedimento e do processo administrativo, que passaria pela revogação expressa das disposições que prevêem o recurso hierárquico necessário (por uma questão de certeza e segurança jurídica), ao mesmo tempo que procedesse à generalização da regra de atribuição de efeito suspensivo a todas as garantias administrativas, eventualmente acompanhada da fixação de um prazo para o exercício da faculdade de impugnação administrativa pelos particulares, prazo este que não teria qualquer relevância para a questão da impugnabilidade do acto administrativo, mas que interessaria, tão só, para a aplicação do regime de suspensão automática da eficácia, até à decisão da garantia administrativa. Considera tratar-se de uma solução que permitiria satisfazer todos os interesses relevantes em presença: o do particular, que passava a ter um estímulo acrescido para utilizar as garantias administrativas, decorrente do efeito suspensivo automático do acto administrativo, sem nunca ver prejudicado, nem precludido o respectivo direito de acesso ao tribunal (art. 59º/4 CPTA); o da Administração, que passaria a gozar, em termos mais alargados, de uma “segunda oportunidade”, para melhor cumprir a legalidade e realizar o interesse público, podendo também, sendo caso disso, satisfazer desde logo as pretensões do particular e pôr fim ao litígio.


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