segunda-feira, 16 de maio de 2011

A “válvula de escape” do art. 121º CPTA

O art. 121º do CPTA, inspirado no regime italiano, foi uma das inovações trazidas pela última Reforma do Contencioso Administrativo. Com o surgimento desta disposição passou a ser possível emitir um juízo sobre a causa principal na pendência de um processo cautelar, o que alguns autores denominam de convolação do processo cautelar em processo principal, promovido por iniciativa oficiosa do tribunal ou suscitado pelas partes (de notar que neste caso, a eventual pronúncia expressa do tribunal no sentido de não proceder à convolação não é passível de recurso).
Compreende-se que o legislador após ter consagrado quatro tipos “base” de tutela urgente (o que faz todo o sentido, já que como refere VIEIRA DE ANDRADE garante-se assim que não haja demasiadas situações de urgência processual) tenha também tido em consideração a necessidade de regular outras situações não enquadráveis nas previstas nos arts. 97º a 111º CPTA, que também têm necessidade de uma tutela urgente, não comprometendo desta forma a tutela jurisdicional efectiva e assegurando assim o direito ao processo efectivo e temporalmente justo.
Para que o instituto previsto no art. 121º CPTA possa operar é necessária a verificação cumulativa de três requisitos (embora parte da doutrina como é o caso de AROSO DE ALMEIDA fale apenas em dois requisitos, a meu ver e de alguma doutrina faz sentido falar de três como se verá infra), sendo que, um é de natureza substantiva e os outros dois são de natureza processual. São eles:

1.       “… a manifesta urgência na resolução definitiva do caso” (RS)
2.       “… tenham sido trazidos ao processo todos os elementos necessários para o efeito” (RP)
3.       “… ouvidas as partes” (RP)

Cabe então fazer uma breve análise de cada requisito. Quanto ao 1º requisito, haverá que atender às circunstâncias do caso, nomeadamente à gravidade das lesões/interesses (inutilidade e irreversibilidade) como as que prevê o art. 120º/2 CPTA e também ao facto de a situação não se compadecer com a adopção de uma simples providência cautelar. Há autores, como DORA NETO que defendem que se deverá separar a “manifesta urgência” do facto de não ser suficiente adopção de uma providência cautelar, concluindo a autora pela existência de dois requisitos de natureza substantiva e outro de natureza processual, porém com todo o respeito, não parece proceder tal entendimento, dado que a impossibilidade de adopção de uma providência cautelar é um dos critérios que justifica a urgência, a titulo exemplificativo veja-se o art. 109º/1 CPTA.
O 2º requisito é compreensível, já que o juiz quando emite um juízo sobre a causa principal dispõe de todos os elementos que lhe permitem com certeza emiti-lo, por maioria de razão, a mesma “segurança” deve o juiz ter quando antecipa esse juízo. Caso não exista essa tal “segurança”, a melhor solução parece ser a defendida por AROSO DE ALMEIDA que afirma que o caminho será o de atribuir a providência sem mais indagações nos termos do art. 120º/1/a) CPTA.
Por fim, o 3º requisito, como refere MARLENE SENNEWALD (e VIEIRA DE ANDRADE de certa forma), é uma manifestação do principio do contraditório, já que o juiz ouve as eventuais objecções que as partes formulem acerca da verificação dos requisitos supra referidos. Penso que o entendimento desta autora faz todo o sentido, quando diz que “(…)este requisito ou não é, sequer, referido expressamente, ou aparece desprovido de autonomia relativamente ao requisito processual da existência, no processo, de todos os elementos necessários para a decisão de mérito(…)entendemos porém, que é relevante que este requisito seja referido expressamente e de forma autónoma(…)”, de facto e como entende a autora, aproximar a audição das partes da existência de todos os elementos necessários à decisão da questão de fundo não faz sentido pois são coisas bastante diferentes, já que a audição das partes corresponde a um dever inerente ao juiz decorrente do principio do contraditório, posteriormente as declarações das partes podem ser tidas como elementos necessários à decisão, mas coloca-las a priori no mesmo plano não parece ser correcto.
Após esta sumária explanação do regime do art. 121º/1 CPTA é necessário também fazer uma breve referência ao facto de o nº2 do art. abrir a possibilidade de impugnar a decisão de convolação. Poderá então qualquer das partes impugnar a decisão de antecipar o juízo sobre a causa principal com base no não preenchimento dos requisitos de que depende, como visto supra, neste caso o tribunal superior poderá revogar a decisão e ordenar que o tribunal recorrido não antecipe o julgamento do mérito da causa e aprecie a providência cautelar requerida, com a consequência de ficar sem efeito o julgamento sobre o fundo da causa.
Concluindo, a meu ver, parece que o legislador fez uma boa opção em consagrar este regime no CPTA, não seria justo nem eficaz termos uma taxatividade tão grande neste domínio que permitisse que situações com um manifesto carácter urgente e que fossem causadoras de danos irreversíveis tivessem um regime tão diferente do previsto para os processos urgentes. Porém, a rigidez dos requisitos apresentados devem ser acompanhados de uma grande prudência dos tribunais como refere VIEIRA DE ANDRADE de modo a não cairmos numa situação em que tudo é urgente, conduzindo assim à frustração das boas intenções do legislador.

João Carlos Neto Peixe, nº17356

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