quarta-feira, 25 de maio de 2011

O que ainda faz falta...

r O Prof. Vasco Pereira da Silva, expõe alguns aspectos essenciais do Processo Administrativo que num estado democrático e de direito têm de encontrar solução e consagração e que contudo não foram ainda abrangidos pela reforma.
Primeiramente, a questão da responsabilidade civil publica que terá de ser regulada em termos adequados à Constituição da República Portuguesa e de acordo com um sistema coerente. Devendo passar por uma unificação no âmbito da jurisdição administrativa da competência para conhecer dos litígios que se refiram a todas as funções estaduais, comportando assim a função politica, legislativa e jurisdicional Devendo por outro lado acabar com distinções que o Professor classifica como “ilógicas e artificiais” sendo exemplo a gestão pública e a gestão privada.
Relativamente a este tema, a lei 67/2007 de 31 de Dezembro não se demonstrou suficiente, pois apesar de regular o Regime da Responsabilidade Civil Extracontratual do Estado e Demais Pessoas Colectivas Publicas (uniformizando assim o regime jurídico aplicável à responsabilidade decorrente do exercício de funções administrativas, político-legislativas e judiciais), mantêm uma lógica que o Prof. Vasco Pereira da Silva classifica como “esquizofrénica” do tratamento da responsabilidade administrativa.
Por outro lado, outro ponto que se revela como essencial, é o do alargamento da aplicação do Código do Processo dos Tribunais Administrativos ao âmbito da justiça tributaria. Pois se o objectivo passa pela especialização dos tribunais tributários no domínio da jurisdição administrativa e fiscal, ela justifica-se em razão da matéria e não por virtude das regras processuais. Ilógico será que na mesma jurisdição que se encontra consagrada unificadamente na nossa Constituição no seu art. 20, reinem dois regimes jurídicos processuais diferentes como acontece com os tribunais jurídicos e fiscais.
Cabe ainda, acompanhar a aplicação criadora das novas regras processuais pela jurisprudência, reajustando as normas conforme as necessidades que forem sendo evidenciadas pela prática, evitando assim a estagnação do contencioso administrativo.
Será ainda necessário, proceder à compatibilização das novas normas processuais com o Código do Procedimento Administrativo, no que respeita às formas de actuação administrativa. O Prof. Vasco Pereira da Silva ressalva contudo que a importância das matérias em causa irá obrigar à “ponderação e discussão de diferentes alternativas em função das circunstâncias presentes e de juízos de abertura ao futuro e não dos traumas do passado de forma a evitar reformas precipitadas, minimalistas e meramente cosméticas.”

Fica assim em jeito de apanhado, aquelas que são para o Prof. Vasco Pereira da Silva as principais carências do actual Contencioso Administrativo.

Breve análise ao problema do contencioso da responsabilidade civil publica

A responsabilidade civil das entidades públicas, é essencial sendo inclusivamente nas palavras do Prof. Vasco Pereira da Silva, um “pilar” do estado de direito, que encontra consagração no art. 22 da CRP, contudo o direito a indemnização quando forem lesados direitos fundamentais é também ele um direito fundamental nos termos do art. 16 e 17. Assim é necessário atentar no relacionamento entre as normas da lei fundamental e a lei ordinária, verificando ainda como alerta o Prof. Vasco Pereira da Silva a questão “se o direito da Responsabilidade civil extracontratual da administração pública é Direito Constitucional concretizado ou por concretizar.”
A reforma entrada em vigor em 2004, é incompleta no que respeita a esta matéria. Apesar da matéria da responsabilidade civil publica integrar as propostas legislativas que compunha a Reforma do Contencioso Administrativo, a mesma acabou por não ser aprovada na Assembleia da República
Agravando, o regime jurídica da responsabilidade extracontratual do estado e demais entidades públicas, vigorando pela Lei no 67/2007 de 31 de Dezembro, acabou por não resolver todas as questões e consagrou um regime que na opinião do Prof. Vasco Pereira da Silva “não é inteiramente coerente com a letra e o espírito da reforma administrativa.”

A importância da Revisão Constitucional de 1997 para o Contencioso Administrativo

A revisão constitucional de 1997 no que toca ao contencioso administrativo, pauta-se por dois pontos-chave de influência.
Primeiramente, esta revisão vem reafirmar as grandes opções da revisão constitucional de 1989, nas quais se destacam pela sua importância:
A jurisdição administrativa especial no âmbito do poder judicial, consagrada no art. 209 da CRP.
As relações jurídicas administrativas como objecto do contencioso que encontra lugar na nossa constituição no número 3 do artigo 211.
A impugnabilidade do acto lesivo, que encontra previsão no art. 268 n4 da CRP.
Por outro lado esta revisão vem regular de um novo modo a garantia constitucional de acesso à justiça administrativa, consagrando o direito fundamental à impugnação de normas no art 268n5 e tal como afirma o Prof. Vasco Pereira da Silva : “enunciando os demais meios processuais do contencioso administrativo, enquanto instrumentos ao serviço do direito à tutela plena e efectiva dos direitos dos particulares, no nº 4 do artigo 268”
É aqui que reside a grande diferença, não se prendendo assim com meras alterações de foro formal, mas com uma mudança substancial da lógica com que se interpreta e entende o contencioso administrativo, que segundo esta revisão acabara por se centrar numa tutela plena e efectiva dos direitos dos particulares. É em torno deste princípio que se irão definir e organizar os diferentes meios processuais. Existe assim uma inversão, após esta revisão são os meios processuais que giram em torno da tutela referida e não o contrário.
Esta protecção era garantida através de sentenças cujos efeitos não se bastariam com a simples apreciação e reconhecimento de direitos mas também à condenação à prática de actos administrativos legalmente devidos e ainda a impugna dos actos administrativos bem como adequadas medidas cautelares. O Prof. Vasco Pereira da Silva considera isto como “a superação de todos os complexos de infância difícil do Contencioso Administrativo que nascera como um recurso hierárquico institucionalizado, em que os poderes do juiz eram limitados à anulação dos actos administrativos mas que agora se tinham transformado num contencioso pleno e subjectivo em que os efeitos não se defrontam com qualquer limitação natural ou congénita, antes devem ter por critério e medida (a plenitude e efectividade) dos direitos dos particulares necessitados de tutela.” Estas opções por constarem de um direito fundamental de acesso à justiça administrativa com natureza análoga aos direitos liberdades e garantias, gozavam, desde logo de aplicabilidade imediata pelo art. 18 da CRP.
Foi assim uma antecipação da presente reforma do contencioso administrativo. Que obrigou o legislador a uma intervenção cada vez mais necessário para concretizar o modelo de contencioso administrativo da lei fundamental. Tornando assim a reforma numa urgência.

Artigo 109º a 111º CPTA - Intimação para protecçao de direitos, liberdades e garantias

Este meio processual regulado nos arts. 109.º a 111.º do CPTA constitui um processo autónomo, isto é um processo principal, e não cautelar, que implica a emissão duma decisão definitiva e destina-se a dar cumprimento à exigência ditada pelo art. 20.º, n.º 5 da CRP, quando nele se estatui que para “… defesa dos direitos liberdades e garantais pessoais, a lei assegura aos cidadãos procedimentos judiciais caracterizados pela celeridade e prioridade, de modo a obter a tutela efectiva e em tempo útil contra ameaças ou violações desses direitos …”, normativo este que constitui uma das mais relevantes inovações introduzidas pela Lei Constitucional n.º 01/97.

Constituindo um processo de intimação, isto significa que se trata de um processo dirigido à emissão de uma sentença de condenação, mediante a qual o tribunal impõe a adopção de uma conduta, positiva (uma acção), ou negativa (uma abstenção).

Os pressupostos de admissibilidade deste processo urgente são os seguintes:

a) A necessidade de emissão urgente de uma decisão de fundo do processo que seja indispensável para protecção de um direito, liberdade ou garantia;
b) Que o pedido se refira à imposição dum conduta positiva ou negativa à Administração ou a particulares;
c) Que não seja possível ou suficiente o decretamento provisório de uma providência cautelar, no âmbito de uma acção administrativa normal (comum ou especial).

Do exposto se conclui a natureza subsidiária da intimação, pois do artigo 109º CPTA, se extrai que a necessidade da intimação urgente, sob a forma de decisão definitiva, afere-se pela impossibilidade ou insuficiência da intimação urgentíssima provisória, sob a forma de decisão cautelar, regulada no artigo 131º, para assegurar uma protecção eficaz destes direitos.

Ou seja, a regra em matéria de tutela jurisdicional é o lançar mão das formas de tutela principal não urgente para efectivação e defesa de direitos, liberdades e garantias, ficando a tutela principal prevista nos arts. 109.º e seguintes do CPTA reservada apenas para as situações em que aquela via normal não é possível ou suficiente para assegurar o exercício em tempo útil e a título principal do direito, liberdade ou garantia que esteja em causa e cuja defesa reclame uma intervenção jurisdicional.

A intimação será absolutamente necessária quando não puder ser dispensada, ou seja quando, para proteger direitos fundamentais, a intensidade da necessidade de protecção imediata impeça, por não ser possível em tempo útil, o recurso a um outro meio processual (por exemplo a acção administrativa comum) que seria o meio adequado ou o meio próprio para resolver definitivamente a questão existente.

A este propósito referem M. Aroso de Almeida e C.A. Fernandes Cadilha que o “… processo de intimação para protecção de direitos, liberdades e garantias é, assim, instituído como um meio subsidiário de tutela, vocacionado para intervir como uma válvula de segurança do sistema de garantias contenciosas, nas situações - e apenas nessas - em que as outras formas de processo no contencioso administrativo não se revelam aptas a assegurar a protecção efectiva de direitos, liberdades e garantias.
(…) O que em situações deste tipo é necessário, é obter, em tempo útil e, por isso, com carácter de urgência, uma decisão definitiva sobre a questão de fundo: a questão tem de ser definitivamente decidida de imediato, não se compadecendo com uma definição cautelar. O processo principal urgente de intimação existe precisamente para suprir as insuficiências próprias da tutela cautelar, que resultam do facto de ela ser isso mesmo, cautelar …”

Nesta matéria não podemos ainda deixar de ter em atenção o mencionado por Isabel Celeste Fonseca quando sustenta que a “… a intimação será absolutamente necessária quando não puder ser dispensada, ou seja quando, para proteger direitos fundamentais, a intensidade da necessidade de protecção imediata impeça, por não ser possível em tempo útil, o recurso a um outro meio processual (por exemplo a acção administrativa comum) que seria o meio adequado ou o meio próprio para resolver definitivamente a questão existente …” (in: “Dos Novos Processos Urgentes no Contencioso Administrativo (Função e estrutura)”, págs. 76 e 77).
E continua a citada autora “… para compreender o conceito de subsidiariedade estabelecido no art. 109.º, o que conta é a capacidade ou incapacidade da medida cautelar para regular definitivamente uma situação e não a urgência.(…) de acordo com a letra da lei, subjacente à necessidade da intimação urgente definitiva existe uma situação de urgência, mas para a qual não servem as vias processuais comuns, porque são lentas demais, nem presta a medida cautelar urgentíssima. E esta não serve por uma razão: porque é uma medida cautelar e, por isso, porque é caracterizada pela provisoriedade. E, não satisfazendo no caso concreto o regulamento provisório, ela deve ser preterida perante o processo urgente que julgue definitivamente o mérito da causa.
(…) A forma como o factor tempo interfere com o direito que é objecto do processo e de como este só se realiza se a decisão do juiz for imediata são condições que obrigam à emissão de uma decisão que não pode ser provisória, porquanto qualquer que seja a decisão formal que o juiz emita, ao pronunciar-se sobre o pedido cautelar, ele decide sobre o objecto do processo principal (que vier a ser proposto, se entretanto o não foi), já que, nestes casos, o objecto medito dos processos se identifica com a referência à situação substancial a acautelar. E esta não se compadece com uma decisão provisória.
(…) Contudo, nem todas as situações de urgência se satisfazem sem que as decisões antecipatórias ultrapassem os limites da técnica da antecipação. São estas que cumpre identificar caso a caso. E sempre no caso concreto, através dum juízo de prognose, que estas se identificam: i) são de natureza improrrogável, que reivindica uma composição jurisdicional inadiável; ii) têm uma natureza que não se compadece com a provisoriedade jurisdicional e que obriga o juiz a pronunciar-se de modo definitivo. Definitivo, no sentido de solução fatal, já que ela matará a utilidade posterior de qualquer sentença de mérito que vier a ser emitida no âmbito de um processo principal que conheça sobre essa situação, de modo mais profundo …” (in: ob. cit., págs. 78 a 83).

Concluindo a referida autora sustenta que existem “… situações claras de urgência que são propícias a exigir decisões de fundo. De uma forma generalista, podemos dizer que a situação de urgência pode manifestar-se pela sua configuração em função do tempo: situações sujeitas a um período de tempo curto, ou que digam respeito a direitos que devam ser exercitados num prazo ou em datas fixas - questões conexas com uma eleição, incluindo campanhas eleitorais, situações decorrentes de limitações ao exercício de direitos num certo dia ou numa data próxima, actos ou comportamentos que devam ser realizados numa data fixa próxima ou num período de tempo determinado, como exames escolares ou uma frequência do ano lectivo. Podem configurar igualmente casos de urgência situações de carência pessoal ou familiar, em que esteja em causa a própria sobrevivência pessoal de alguém. Casos relativos à situação civil ou profissional de uma pessoa podem constituir igualmente uma situação de urgência.
(…) Este processo de intimação urgente definitiva permite ao juiz, no domínio de direitos, liberdades e garantias, decidir legitimamente a questão de fundo de modo definitivo, nos casos em que as situações concretas de urgência verdadeiramente o mereçam e o exijam.
Para compreender os pressupostos de admissibilidade da intimação para protecção de direitos, liberdades e garantias, deve partir-se da consideração da absoluta necessidade de emissão de uma decisão de mérito pelo facto de uma medida cautelar se revelar, num certo caso, como impossível ou insuficiente.
Já o caso oposto, quando se deva entender que a questão subjacente, ainda que seja relativa a direitos, liberdades e garantias, possa provisoriamente ser composta por via cautelar, esta deve ser a escolha preferida em detrimento da intimação definitiva, podendo actuar cumulativamente com um outro instrumento de tutela principal ...”(in: ob. cit., págs. 84 e 85)

Bibliografia:
M. Aroso de Almeida e C.A. Fernandes Cadilha in: “Comentário ao Código de Processo nos Tribunais Administrativos”, 2.ª edição revista
Isabel Celeste Fonseca in “Dos Novos Processos Urgentes no Contencioso Administrativo (Função e estrutura)”

Princípios do processo administrativo relativos à prova



O processo administrativo no âmbito da prova (ou da instrução) é regido pelos seguintes princípios:

  •   Princípio da investigação (do inquisitório ou da verdade material);
  •  Princípio da universalidade dos meios de prova;
  • Princípio da aquisição processual;
  • Princípio da livre apreciação das provas;
  • Princípio da repartição do ónus da prova objectivo (“material” ou “de averiguação”).


De acordo com o princípio da investigação do inquisitório ou da verdade material), os fundamentos da decisão do juiz não têm de se limitar aos factos carreados pelas partes, ao contrário do que acontece num modelo processual caracterizado pelo princípio da discussão, da contradição ou da verdade formal. O princípio da verdade material adquire, assim, no processo administrativo, uma especial relevância. Permite-se por outro lado um verdadeiro inquisitório, quando, além, de se possibilitar ao Ministério Público (MP) a faculdade de solicitar ao juiz as diligências de instrução que entenda (artigo 85.º, n.º 2 CPTA), se autoriza o próprio juiz a ordenar diligências de prova que considere necessários para o apuramento da verdade (artigo 90.º, n.º 1 CPTA). Pode ainda o juiz recusar requerimentos para produção de prova sobre determinados factos ou para utilização de meios de prova, quando o considere claramente desnecessário (artigo 90.º, n.º 2 CPTA).

Constituem limites à procura da verdade material por parte do juiz e do MP, o pedido e a causa de pedir (limites externos), bem como, a tipicidade da tramitação. Contudo, os poderes do juiz são entendidos de modo mais amplo, no âmbito dos processos de impugnação de actos, principalmente quanto à possibilidade de estender a instrução a “factos instrumentais” e, ainda, quanto à possibilidade do juiz poder qualificar autonomamente os vícios invocados (na perspectiva de o juiz ter o poder e o dever de conhecer oficiosamente das causas de invalidade do acto impugnado).
Com a reforma, passou a vigorar o princípio da universalidade dos meios de prova, visto que deixou de haver as anteriores limitações legais de prova, como a proibição de depoimento da autoridade recorrida e a exclusão da prova testemunhal e por inspecção em certos processos. Assim apenas constituem limite aos meios de prova as proibições de prova resultantes do artigo 32.º, n.º 6, da Constituição. Ainda que a disposição em causa se refira directamente ao processo criminal vale para todos os processos, tendo maior amplitude no processo administrativo, uma vez que, não são admitidas as excepções previstas para o processo penal.         

Do n.º 2 in fine do artigo 90.º CPTA, resulta que são aplicadas à produção de prova as regras gerais do processo civil, seja no âmbito da acção administrativa especial seja no âmbito da acção administrativa comum.

O princípio da aquisição processual constitui uma decorrência do princípio da verdade material, segundo este o tribunal deverá tomar em consideração todas as provas produzidas, sendo os factos considerados adquiridos para o processo mesmo que prejudiquem quem os alegou (artigo 515.º Código de Processo Civil).

Estabelece o princípio da livre apreciação das provas, que o que torna um facto provado é a íntima convicção do juiz, formada de acordo com a sua experiência de vida. O que não significa que a livre convicção do juiz constitua um livre arbítrio, uma vez que, esta tem como pressupostos valorativos os critérios de experiência comum e da lógica do homem médio (bonus paterfamilias). Limita ainda este princípio o princípio do contraditório, no sentido em que a decisão do juiz não poderá ter por base factos sobre os quais alguma das partes não tenha tido a possibilidade de se pronunciar. A lei estabelece algumas compressões a este princípio, nomeadamente nos artigos 84.º, n.º 5 e 118, n.º 1 CPTA.

Por fim no que toca ao princípio da repartição do ónus da prova objectivo (“material” ou “de averiguação”), cabe referir que não vale no processo administrativo um ónus da prova subjectivo, mas antes um ónus da prova objectivo no sentido em que se pressupõe uma repartição adequada dos encargos de alegação, de modo a repartir os riscos de falta de prova. No sentido objectivo o ónus da prova dependerá sempre da situação processual das partes, tendo contudo, segundo o Professor Vieira de Andrade, de se determinar “de acordo com um quadro de normalidade concreto ou típico, construído com base nas regras específicas do domínio da vida em causa e nos princípios próprios do direito administrativo”.

É aplicável ao processo administrativo a regra geral do artigo 342.º do Código Civil (quem invoca um direito tem o ónus da prova dos respectivos factos, cabendo à contraparte a prova dos factos impeditivos, modificativos ou extintivos). Contudo, no âmbito dos processos impugnatórios impõe-se um regime especial. Nessa senda, não se pode exigir ao autor a prova dos factos constitutivos da sua pretensão de anulação, de modo a caber à Administração apenas a prova das excepções invocadas, dever-se-á antes sujeitar a Administração aos princípios da legalidade e da juridicidade e ao dever de fundamentação, isto é, caberá a esta o ónus da prova da verificação dos pressuposto legais da sua actuação, cabendo ao autor fazer prova bastante da ilegitimidade do acto.



Bibliografia

VIEIRA DE ANDRADE, A Justiça Administrativa (Lições), Almedina, 2011.      

O processo de partes


 Portugal abandonou a visão objectivista que residia como seu modelo processual baseada no princípio da legalidade e a sua conformação numa actuação administrativa, prosseguindo o interesse público. Nesta concepção, tanto a Administração como os particulares não eram considerados partes, pois todo o processo girava em torno do acto administrativo, absorvendo tudo o resto. Existia uma mera relação de poder, não passando disso mesmo.
 É em 1976 que a Constituição faz braço de ferro a essa relação íntima da Administração e poder jurisdicional, integrando o Contencioso Administrativo no Poder Judicial. Contudo, essa separação não foi logo efectuada de modo claro. Nos dias de hoje, regemo-nos por uma concepção subjectivista, tutelando os direitos e as posições jurídicas dos particulares.
Assim sendo, o Tribunal consagra a regra de que tanto a Administração como os particulares são partes, princípio da igualdade, artigo 6º do Código de Procedimento dos Tribunais Administrativos. Este artigo 6º possibilita que qualquer uma das partes seja sancionada pelo tribunal, por litigância de má fé. Já no referente ao regime das custas, qualquer uma das partes pode ser responsabilizada e condenada ao seu pagamento. Os princípios de boa fé e cooperação das partes, presentes no artigo 8º do Código de Procedimento dos Tribunais Administrativos concluem tal ideia. Com esta consagração, rompe-se de vez a corda que ainda ligava o Contencioso Administrativo Português ao modelo objectivista. Diga-se, passa-se de um processo sem partes, de uma promiscuidade clara entre Administração e Poder Judicial, a um processo de partes, em que o particular e a Administração se encontram na mesma situação processual, tendo ambos o dever de colaborar com o juiz na procura da verdade. O artigo 268º da Constituição da República Portuguesa e o artigo 209º da mesma, consagram a inclusão do Contencioso Administrativo no Poder Judicial, bem como a tutela dos direitos e interesses dos administrados.
O Contencioso Português, acolhendo uma tutela subjectiva, traduzida na intervenção dos sujeitos privados, visa a protecção dos seus direitos subjectivos, de acordo com o artigo 9º nº 1 do Código de Procedimento dos Tribunais Administrativos.
Contudo, ao lado dos sujeitos particulares referidos em cima, têm de ser considerados o actor popular e actor público, actuando estes em defesa da legalidade e do interesse público, preservando assim uma vertente objectiva, dentro de um processo organizado de modo subjectivo.
Como Conclusão, enalteço tal evolução, já que é de louvar a inclusão dos sujeitos das relações multilaterais no processo, trazendo com uma maior igualdade, uma maior justiça. Para finalizar, de salientar o Professor Vasco Pereira da Silva, incentivando o legislador e jurisprudência para muitas e novas ideias que permitam um maior e melhor aperfeiçoamento e do Contencioso Administrativo.
                                   

Artigo 22º da CRP e a sua relevância para o direito administrativo


O artigo 22º da CRP consagra o princípio geral da responsabilidade dos entes públicos da administração pública.

O artigo 22º CRP tem então uma imensa relevância jurídica já que a responsabilidade das entidades publicas, que por acções ou omissões, resulta da violação de direitos, liberdades e garantias dos particulares.
É possível afirmar que este artigo implica toda a Administração Pública, não só o Estado.
Segundo afirmam alguns autores, o final deste artigo pressupõe a responsabilidade sem dano, no caso de se verificar somente a violação de direitos, liberdades e garantias dos particulares, o que nos levaria para um reforço dos direitos fundamentais. No entanto, existem grandes doutorados em direito que vêm refutar esta concepção, como o professor Jorge Miranda, desde logo porque a violação de direitos, liberdades e garantias, pressupõe por si só a criação de um dano. Mas também pelo facto de no próprio artigo constar “civilmente responsáveis”, ou seja, atendendo ao pressuposto do dano da responsabilidade civil.
A referência á pratica e responsabilidade por factos ilícitos também constam deste artigo 22º CRP, aquando se enquadra o prejuízo a par da violação de direitos, liberdades e garantias.
Quanto aos princípios inerentes ao artigo em apreço cumpre referir o princípio da solidariedade do ente público e do titular dos seus órgãos, funcionários ou agentes, observando assim os artigos 512º e seguintes do CC por remissão da própria CRP no artigo 271º, nº4. Estabelece, assim, o artigo 22º da CRP, a existência de solidariedade em todos os casos de responsabilidade por actos funcionais, incluindo os ilícitos e os praticados no exercício da gestão privada.
De referir que este artigo será conjugado com o artigo 271º do mesmo diploma, que restringe a aplicação da solidariedade em caso de responsabilidade por acto ilícito, pelo que deveremos conjugar com o artigo 22º para estender a possibilidade de solidariedade ao artigo 271º, que só menciona os funcionários e agentes do Estado
Sendo que os titulares dos órgãos do estado e demais entidades públicas não se encontram presentes no artigo 271, deveremos aplicar o artigo 120º e 218º conjugado com o artigo 22º CRP.

Este artigo, como é possível perceber pela breve analise acima enunciada, terá bastante relevância para o direito administrativo, já que a responsabilidade civil dos órgãos e demais entidades da Administração Publica vem consagrada na própria constituição, impondo o principio de solidariedade, muitas vezes, como solução.