terça-feira, 24 de maio de 2011

Princípios relativos ao âmbito do processo

Na presente publicação iremos abordar sucintamente um tema essencial em todas as cadeiras e que não foi em Contencioso Administrativo muito discutido: os princípios.
As normas processuais administrativas baseiam-se, tal como outras, em princípios, concretizando-os e simultaneamente partindo deles a sua formulação. Ao lado de outros conjuntos de princípios, como os relativos à prova ou à iniciativa processual, apresenta-se-nos um conjunto de princípios relativos ao âmbito do processo, que cabe agora analisar.


Princípio da resolução global da situação litigiosa


Este princípio traduz-se numa forma de garantir que a decisão tomada satisfaz totalmente os interesses das partes. Para que tal aconteça, admite-se que no mesmo processo se tenham em consideração todos os aspectos do litígio, ainda que tal revele alguma complexidade.
O artigo 46º CPTA consubstancia uma manifestação deste princípio, ao permitir a cumulação de pedidos, mesmo que estes sigam formas de processo diferentes.


Princípio da vinculação do juiz ao pedido


Relaciona-se com a imparcialidade e neutralidade do tribunal relativamente ao processo, estabelecendo que o juiz tem de decidir na medida do pedido, encontrando-se a ele vinculado. O tribunal não pode desta forma decidir fora do que lhe foi pedido pelas partes, nos termos do artigo 661º, n,º1 CPC, salvo os casos excepcionais em que a lei lhe confira a possibilidade de conhecimento oficioso. Para além disso, o juiz deve ainda apreciar todas as questões que lhe sejam apresentadas pelas partes, nos termos do artigo 660º, nº2 CPC.


Princípio da limitação do juiz pela causa de pedir


Estabelece que o tribunal terá de basear a sua decisão em factos invocados no processo como fundamentos concretos do efeito jurídico pretendido. Importa referir que a limitação se refere apenas aos factos, sendo o tribunal livre, como não podia deixar de ser, de proceder à qualificação jurídica destes.
Todavia, este princípio nem sempre tem aplicação, como no caso de estarmos perante um processo de declaração de ilegalidade de normas, visto que o artigo 75º CPTA concede ao juiz a possibilidade de realizar tal declaração com fundamento em princípios diversos dos invocados.
Será ainda de excluir no caso de impugnação de acto administrativo pois, como prevê o artigo 95º, n.º2 CPTA, o tribunal possui a faculdade de conhecer oficiosamente vícios do acto (”deve identificar a existência de causas de invalidade diversas das que tenham sido alegadas”).


Princípio da estabilidade objectiva da instância


Segundo VIEIRA DE ANDRADE, traduz-se numa manifestação tradicional do princípio do dispositivo, de acordo com o qual terá lugar no início do processo, com a petição inicial, a determinação do pedido e da causa de pedir. Citado o réu, mantém-se a instância (quanto às pessoas, ao pedido e à causa de pedir) até à decisão final, salvo os casos excepcionados por lei, mediante o disposto no artigo 268º CPC.
Contudo, este princípio depara-se com algumas limitações, nomeadamente quanto à acção administrativa especial.
Um exemplo é o artigo 51º, nº4 CPTA, em que o juiz, pedida a estrita anulação de um indeferimento, convida o autor a substituir a petição inicial e a formular um pedido de condenação à prática de acto devido.
De igual modo o artigo 70º, n.º1 CPTA vem admitir que o autor alegue novos fundamentos, quando a pretensão do interessado seja indeferida pela Administração na pendência do processo. Mesmo nos casos gerais pode haver alteração da causa de pedir, através da invocação de novos vícios, fundamentos ou factos de conhecimento superveniente (artigos 86º e 91º, n.º5 CPTA).



Compete então aferir da atendibilidade das modificações ocorridas pelo juiz, isto é, se os factos jurídicos supervenientes devem ou não ser tidos em conta na tomada de decisão.
Nas situações em que se peça a declaração de uma situação jurídica subjectiva, ou a condenação do demandado na adopção ou abstenção de certo comportamento, não se colocam grandes problemas quanto à atendibilidade de novos factos.
Já no que toca à anulação de actos, à partidas as novas circunstâncias não serão atendíveis se estes forem de eficácia instantânea, pois todos os seus efeitos já se terão produzido quando a acção for intentada. Se, pelo contrário, os actos forem de eficácia duradoura, não se tendo ainda produzido os seus efeitos, já serão de aceitar as novas circunstâncias sempre que tal seja útil e conveniente para se proferir a sentença, a não ser que leve a considerar válido um acto antes inválido. Quando, por outro lado, os novos factos geram a invalidade de um acto antes considerado válido, parecem tais circunstâncias ser atendíveis, quando seja efectivamente ilegal a sua manutenção (na falta de certeza o juiz não deve anular o acto), sendo o acto consequentemente anulado pelo juiz, produzindo-se apenas os efeitos a partir do momento em que se tornou inválido.

Sem comentários:

Enviar um comentário